Você não me reconheceria mais. Você não seria capaz de reconhecer os meus atos, o meu tom de voz, o meu caminhar. Parece que a pessoa que eu fui pertence a um período estranho, deslocado em outra dimensão, em que o mundo era grande demais e eu só tinha energia pra correr e não ser engolida. Essa pessoa não existe mais.
Na verdade, parece que foi na vida de outra pessoa. Hoje, quando eu me sinto tão leve, é como se essas lembranças não fossem mais minhas. Eu não tenho mais medo. Eu não vivo mais com medo. Cada passo não é cheio de ansiedade. Eu não sou mais prisioneira de mim mesma. Hoje em dia, eu vou pra onde meus pés me levarem. Na hora em que eu quiser. O mundo é meu. Ele é meu quintal, e eu estou à vontade em todos os cantinhos. O medo não me paralisa. A culpa não me domina. A ansiedade não me controla.
Eu não sou mais aquela pessoa opaca, esperando migalhas de atenção, faminta de carinho e disposta a tudo para ganhar um olhar mais afetuoso, uma palavra de apoio, um abraço sincero. Você me aprisionou, me fez escrava dos seus caprichos, quando eu acreditei que esse era o único afeto que eu merecia.
Você não me reconheceria mais. Porque hoje eu estou tão eu, e estou tão minha, e eu estou tão leve, e eu estou tão livre que é, de verdade, como se eu tivesse nascido de novo na pele de uma pessoa que tem muita vocação pra ser feliz.