Esses dias eu estava revendo a minha comédia romântica preferida, chamad “Qual é o seu número?”. Resumindo a história, a personagem da Anna Faris decide que não quer transar com mais ninguém novo, e que vai achar o amor de sua vida dentre os caras com quem já transou. Ela contrata o seu vizinho gatinho (Chris Evans) para ajudá-la nessa missão, mas os dois começam a se envolver, e lá pelas tantas, ele a confronta sobre a sua missão mirabolante, perguntando os porquês, dizendo que não tem sentido, até que ela explode e diz: É o que eu quero!
Essa cena me impacta bastante porque eu acho que vi poucas vezes personagens femininas dizerem tão explicitamente que querem alguma coisa, porque querem e fim, sem dar maiores justificativas. Pensando bem, eu não vejo essa cena na vida real muitas vezes, e também não costumo responder para as pessoas que algo “é o que eu quero” como ponto final.
Nós mulheres somos muitas vezes condicionadas a priorizar os outros nas nossas decisões. Fazer escolha em prol dos filhos, dos companheiros, da família, do chefe, etc. Nós somos ensinadas, desde pequenas, a abrir mão dos nossos desejos. Quando as mulheres colocam suas próprias vontades como prioridade, são tachadas de egoístas.
E exatamente para evitar esse tipo de julgamento é que nós inventamos artifícios para justificar nossos desejos, para os outros e para nós mesmas. Não estamos acostumadas a querer simplesmente, porque isso basta para que sejamos capazes de tomar uma decisão. Nós somos treinadas a desejar de maneira condicional, apresentando uma série de argumentos que deem suporte àquele desejo.
Não escutamos “não quero ter filhos”. É sempre “não quero ter filhos, porque minha rotina não comporta crianças”. Não escutamos “eu quero comprar este sapato”. E sim “eu quero comprar esse sapato, porque estava tão baratinho na promoção, e combina com tudo”. Não é de bom tom dizer “eu quero transar com ele”, mas se você ameniza com “eu quero transar com ele, porque ele é um cara muito legal”, até que vai.
Querer as coisas simplesmente porque a gente quer pode ser libertador. No fim das contas, somos nós que vamos ter que conviver diariamente com as consequências das nossas decisões, não as outras pessoas. Seguir os nossos desejos deveria ser natural, e não requerer uma série de malabarismos e desculpas para não sermos vistas como – e nem nos sentirmos – egoístas.
Estou tentando fazer um exercício de justificar menos os meus desejos, e assumi-los mais. Acho que isso é importante porque eu treino que eu posso querer por mim mesma, sem ter que me justificar. E também dizer isso para as pessoas também deixa os limites mais claros para a interferência delas. Não estou dando motivos com os quais a pessoa pode argumentar; estou expressando o meu desejo e só.
Muitas vezes eu sinto que a nossa autonomia nos é tirada quando se é mulher. Se apoderar das decisões das nossas vidas está nas pequenas e nas grandes coisas, porque é só seguindo o que a gente realmente quer, é que a gente consegue ser mais feliz.