
Ele deu trabalho.
Cheguei no hostel morta, pensando que eu deveria realmente botar o pé no freio e não virar as noites na gandaia se eu tivesse que viajar logo cedo no dia seguinte, porque ter que carregar mala com ressaca e gosto de cabo de guarda-chuva na boca estava foda. O mocinho da recepção me atendeu na maior lerdeza, e eu impaciente só queria que ele me desse logo a chave do quarto para eu dormir até a dor de cabeça passar. Ele não conseguia encontrar minha reserva e eu tentava me manter calma, até que saiu de dentro da área do staff um sujeito tão deslumbrante que quase fez a minha ressaca passar instantaneamente.
Cabelos loiros e longos presos no coquinho da moda, braços cobertos de tatuagens, estilo bem fashionista de se vestir. Eu imediatamente desejei que não estivesse tanto com cara de ontem, quando ele me mediu de cima a baixo sem esboçar nenhuma reação. Perguntou ao colega qual era o problema e em dois segundos encontrou minha reserva, me entregando as chaves. Eu agradeci sem graça, e ele acenou indiferente, terminando de bolar um cigarro. Avisou ao mocinho que ia sair para fumar e eu fiquei pregada no chão, pensando em como eu ia conseguir descobrir qual era o nome dele.
***
Viagem é um negócio estranho, você conhece aquele sujeito que está mochilando há dez meses, aquele casal da dinamarca que chegou ontem, aquelas meninas que já passaram pelos lugares que você vai passar e de repente parece que todo mundo é amigo de infância. Já era o segundo dia que saíamos todos junto com o staff. Uma das meninas que dividia o quarto comigo estava pegando o mocinho que me recepcionou no primeiro dia. O amigo gato dele nunca aparecia, e eu estava ficando decepcionada, até que ele de repente se materializou na boate, bolando mais um cigarro.
Àquela altura eu já estava no terceiro shot, e sorri para ele entre o canudo da minha bebida. Ele sorriu minimamente de volta, só com o canto da boca, me encarando por trás dos cílios longos. Não se demorou no olhar, passando para cumprimentar todo mundo. Quando chegou na minha vez, ele colocou a mão bem no fim das minhas costas, quase na bunda. Eu não deixei barato, colando meu corpo no dele, e sentindo um estalo percorrer toda a minha pele. Ele me soltou e nem olhou para mim, terminou de cumprimentar todo mundo e foi para um canto. Eu suspirei, exasperada. Era óbvio quem estava ganhando e quem estava perdendo naquele jogo.
A noite foi passando num borrão. Sempre tinha alguém que chegava que conhecia alguém, e eu estava virando shot atrás de shot sem ter que desembolsar um centavo. Pedi uma água para dar uma baixada no meu nível alcóolico e me virei para ver o grupo do staff gritando e pulando ao som do último hit do Bruno Mars. Ele só olhava de canto, rindo baixinho, claramente deslocado. Eu, que sabe-se Deus por que tenho uma queda por gente blasé, só faltei colocar o babador.
Toda vez que ele tinha que passar, se esfregava em mim. Para pedir licença descia as mãos pela minha cintura e apertava, ou então se espremia atrás de mim, fazendo com que a gente ficasse colado. Eu já estava bem bêbada, e sem paciência para aquela tortura. Não entendia se ele me queria ou estava só me provocando, e se queria, quando ia fazer alguma coisa. Ele obviamente estava se divertindo em ter o controle da situação e me ver me contorcendo. A atmosfera estava carregada de tensão sexual quando num momento de particular distração do grupo, ele segurou meu braço na altura no cotovelo e sussurrou no meu ouvido, “vamos ali fumar um cigarro”. Em um minuto tínhamos nos empirulitado para área de fumantes, eu tinha certeza que ninguém dos nossos amigos tinha nem notado o que aconteceu, e não pude negar que me impressionei com as suas habilidades de sedução ninja.
Ele bolou um cigarro e eu fiquei olhando os seus dedos habilidosos alisando a seda, imaginando mil e uma putarias – céus, será que pensar essas coisas toda hora é normal?? – até que ele selou o cigarro com a língua e me deu. O papo começou a fluir, e e longe de todos ele me surpreendeu. Estava genuinamente desarmado, e levamos uma conversa relaxada e natural sobre tudo. Ele falava baixo, sem afetação, não se expressava de uma maneira hiperbólica, não precisava se autoafirmar. Ele era, simplesmente era, sem arrogância, confiante o suficiente para trocar ideias sem tentar me impressionar a cada duas frases.
Continuamos a conversa dando uma volta no quarteirão. A noite estava agradável e o papo foi ficando uma delícia. Paramos na esquina e a conversa foi arrefecendo. Ele me encarou com os olhos claros, e eu senti como se ele estivesse furando um buraco em mim. Eu sorri. Sou péssima em sutilezas.
– O que foi?
– Nada.
– Nada? Você vai me dizer por que me chamou pra dar uma volta ou vai ficar parado me olhando?
Ele sorriu de lado, aquele mesmo sorriso sem vergonha de quem está adorando jogar.
– Eu sou tímido. – Ele disse, dando de ombros, num tom que misturava sarcasmo e seriedade na mesma medida. Ele só podia estar de sacanagem.
– Ah, é? Eu não sou. Tô a fim de você. – Ele deu uma risadinha, se apoiou no muro com ares de cerimônia. Me puxou pra perto pela cintura, subiu a mão pressionando as minhas costas, até a minha nuca. O rosto dele estava bem próximo, ele estava respirando na minha boca, e eu estava intoxicada – de álcool, de tesão, de juventude. Ele chegou bem perto, quase me beijou, quase. Aí puxou o meu cabelo na altura na nuca, me afastando de novo e inclinando o rosto para acompanhar minha reação. Eu soltei um gemidinho de desespero e ele sorriu satisfeito, segurou meu queixo e me beijou um beijo que eu senti da sola dos pés até a raiz dos cabelos.
***
Nos demoramos mais um tempo na boate, enquanto dançávamos com o resto do pessoal. Até que ele virou pra mim e murmurou um “vamos” tão decidido que eu me senti um coelhinho indo para o abate. Voltamos para o hostel, entramos no quarto que ele dividia com dos meninos. Eu perguntei se ele não ia voltar. Ele explicou que tinha combinado com o cara de ele passar a noite em outro lugar. Eu levantei uma sobrancelha, porque ele estava planejando aquela armadilha desde o começo e eu tinha caído direitinho.
Ainda bem.
Ele me fez deitar na cama bagunçada, separando minhas pernas com o joelho. Quando desceu o peso sobre o meu corpo, enfiou as mãos por dentro da minha blusa, segurando minha cintura, e me beijando daquele jeito que parecia que ia sugando o ar de dentro dos meus pulmões. Ele ondulava os quadris, rebolava, raspando o pau em mim por debaixo da calça, e eu estava sentindo a visão escurecer de tão excitada. A tensão da noite inteira tinha me deixado em ponto de bala, e ele continuava a pressionar o corpo contra o meu, de uma maneira tão insistente que era quase opressiva. Eu sentia que eu era uma das presas daquelas cobras que matam por sufocamento, quanto mais eu me mexia, mais presa ficava.
Cada movimento me ateava fogo. Meu corpo estava em brasas quando ele começou a finalmente ir tirando minhas peças de roupa. Uma a uma, bem devagar, me torturando mais. Cada beijo parecia ser direto na carne, direto no nervo. Transar com ele dava a sensação de ser rasgada por uma faca, que ia muito fundo, só que em vez de causar dor, causava prazer.
Perdi a noção do tempo. Perdi o controle dos meus músculos. Perdi o filtro das minhas palavras. Fui reduzida aos meus instintos mais básicos. Na cama dele, eu me senti fêmea, me senti dominada pelos meus desejos, o quarto inteiro cheio de feromônio. Tudo era sexo. Não conseguia pensar mais em mais nada quando ele me chupava, só esperar que a língua dele me tocasse de novo, de novo e de novo, enquanto eu me abria, me esfregava na maciez molhada dos lábios dele. Não consegui pensar em mais nada enquanto ele me comia, concentrada absolutamente na sensação do pau dele me preenchendo, o gosto do suor dele na minha boca, os rasgos que eu abria com as unhas nas suas costas.
Quando acabou, eu estava exausta. Mas podia sentir que o corpo dele ainda vibrava ao lado do meu. Descansamos um pouco. Começamos a nos tocar de leve, fazendo um carinho, reparando o que podia fazer o outro se arrepiar. Não demorou começamos de novo. O cansaço não tinha como competir com a energia sexual que ele tinha despertado em mim, o ar estava tão elétrico que dava a impressão de que dava para riscar um fósforo entre nós dois. Fui caçada e devorada por ele, uma presa devidamente abatida, uma, duas, três, quatro vezes.
Paramos ao amanhecer. Ele adormeceu dentro de mim, me prometendo mais uma noite antes que eu deixasse a cidade.